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Review de Arcanum of Steamworks & Magick Obscura – Isometria mágico-tecnológica

Sumário

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Steampunk: um mundo arcaico onde a tecnologia avançada envolvendo engrenagens e máquinas a vapor, é certamente uma das ambientações mais interessantes da ficção. Porém, mesmo com seu grande potencial em criar mundos extraordinários, ela raramente é utilizada de maneira realmente satisfatória, e no caso dos RPGs eletrônicos a coisa não é muito diferente, com Final Fantasy VI sendo seu principal representante, ainda nos meados da década de 90. Arcanum: Of Steamworks & Magick Obscura, em 2001, trouxe esse cenário para o espectro ocidental dos role playing games, isso tendo a mesma engine e equipe responsável pelos dois primeiros jogos da série Fallout (antes da mesma virar um FPS 3D).

Arte promocional de Arcanum, mostrando bem o contraste entre a fantasia medieval e o steampunk

Arte promocional de Arcanum, mostrando bem o contraste entre a fantasia medieval e o steampunk

Mas será que esse título, apesar de não ser tão conhecido e jogado quanto outros RPGs isométricos da época, conseguiu fazer um bom trabalho com a ambientação steampunk, fazer um bom uso do legado de Fallout e ainda por cima resultar em um bom jogo? Vejamos isso em detalhes abaixo… E sim, com spoilers!

Isso não é feitiçaria, é tecnologia

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A história de Arcanum se passa em um mundo do mesmo nome, local onde Orcs, Elfos e Anões vivem juntamente com a moderna tecnologia instituída pelo famoso Gillbert Bates (chamado de Gill Bates em alguns momentos, uma clara alusão ao fundador da Microsoft) e tem início com um zepelim sendo atacado por orcs pilotando aviões e, desse acidente, apenas 2 indivíduos sobreviveram: o protagonista (self insert 100% customizável) e um anão sem barba, mas este último não ficou vivo por muito tempo, e apenas conseguiu entregar um anel ao personagem principal, lhe deixando incumbido de encontrar por alguém que ele chamou de “garoto”. Pouco tempo depois um candango chamado Virgil surge, e revela que o personagem principal, por ter sobrevivido àquela tragédia, certamente seria o The Living One, a reencarnação do lendário elfo Nasrudin que, tal como a profecia da religião Panarii dizia, surgiria em asas de fogo para combater o terrível Arronax.

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Com isso, o protagonista, acompanhado de Virgil, sai pelo mundo investigando não apenas a lenda da qual aparentemente fazia parte como também o misterioso anel com o qual fora incumbido. Nesse meio tempo membros de uma sociedade secreta chamada de Molochean Hand, começaram a perseguí-lo por tudo quanto e lado e assim a trama se desenvolve, com algumas descobertas sendo feitas aqui e ali, como o garoto citado anteriormente ser o Gill Bates, e o fato dele ter roubado a tecnologia steampunk dos anões ter causado um enorme desequilíbrio no mundo de Arcanum, já que tecnologia e magia são como água e óleo aqui, e onde um prevalece, o outro definha.

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E assim o protagonista foi avançando mais na investigação, passando por anões (onde um clã inteiro, o Black Mountain, foi inteiro dizimado por terem passado a tecnologia pro Gill Bates), elfos (onde conversa com a Silver Lady, a rainha do lugar, que fala por enigmas, e sua filha, Raven) e elfos negros (onde o jogador, se for do alinhamento Evil, pode se aliar à eles e ter um pequeno desvio na narrativa principal) acaba descobrindo que o elfo das lendas, Nasrudin, do qual se acreditava que o personagem principal fosse a reencarnação, estava vivo, escondido em uma cabana em uma ilha no meio do nada!

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Também é revelado que ele era pai de Arronax, e teve que baní-lo para o Void (um lugar de onde a alma não poderia sair, mesmo através de necromancia), de onde o mesmo estava tentando escapar de alguma maneira e novamente tentar dominar o mundo. Assim, o protagonista sai para encontrar um artefato chamado Vendigroth Device, que poderia destruir um espírito para todo o sempre, e parte para o Void para finalmente colocar um fim em tudo aquilo… 

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Mas ao chegar lá e encontrar com Arronax o protagonista o encontra preso em uma barreira de energia, e o mesmo revela que ele nunca pensou em sair dali e que tudo de ruim que estava acontecendo na superfície foi obra de outro indivíduo: Kerghan, um neromante que fora banido ao Void no passado pouco antes dele, e que durante 2000 anos chegara à conclusão de que a vida nada mais era do que um reino de dor e sofrimento e apenas a morte seria a verdadeira ordem da natureza, e portanto iria abdicar todo ser vivo de tal mal.

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Kerghan também havia manipulado os Elfos negros (fazendo-os pensar que ele era Arronax), fez os anões serem banidos para o Void apenas para que construíssem um portal que o permitiria voltar para a superfície (e com isso um dos anões escapou, sendo ele o que entregou o anel para o protagonista no começo do jogo), basicamente todas as desgraças do jogo eram responsabilidade dele

Assim, o jogador tem 3 opções para lidar com Kerghan e terminar o jogo: Descer o braço nele e usar o Vendigroth Device para finalizá-lo para sempre, se unir a ele e ajudá-lo a destruir o mundo dos vivos ou, tal como acontecia no primeiro Fallout, convencê-lo de que ele estava errado e fazê-lo se matar, com essa última opção dependendo dos stats do jogador (no caso persuasão e carisma).

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Bem, essa é a história de Arcanum. Dependendo das sidequests que o jogador fizer (relacionadas às cidades do jogo) algumas cenas no final podem mudar ou não (tal como acontecia nos dois primeiros Fallouts), mas nada realmente significativo que mereça ser mencionado (ainda mais por serem coisas extras que não afetam em nada a mainquest, a campanha principal do jogo). No geral, a narrativa aqui segue o mesmo esquema de outros RPGs ocidentais desse final da década de 90/começo dos anos 2000, com o jogador controlando um personagem self insert sem eira nem beira enquanto investiga alguma coisa que acaba desembocando em algo grande, normalmente causado por um vilão bem fraquinho.

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Kerghan aqui no jogo até teve bastante potencial, com muitos aspectos lembrando até mesmo Kefka Pallazo de Final Fantasy VI, por ter chegado a uma conclusão parecida com a dele, de que a vida seria um conceito que precisava ser destruído. Contudo ele terminou sendo muito prejudicado, seja pelo fato dele ser um Necron da vida (ou seja, estando escuso do roteiro principal até os 45 do segundo tempo, com o jogador até então pensando que outro indivíduo seria a real ameaça, até ter a revelação que não) ou à possibilidade de que um zé roela surgido do nada consiga mudar suas convicções de um necromante de mais de 2000 anos de idade apenas por ter supostos carisma e percepção avançados, fazendo-o se matar no processo! Obviamente que isso não faz o menor sentido, porém, devido à natureza maleável saturada de escolhas do jogo a mentalidade do personagem teve de ser simplificada para que seus argumentos (que o próprio Arronax, até mais velho do que ele, não havia conseguido dissolver) pudessem ser destruídos facilmente pelo jogador usando alguma lógica relativista estúpida!

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Quanto à party, existem vários companions que o jogador pode conseguir durante sua aventura, entretanto eles não estão 100% interligados com a história principal e principalmente com o protagonista (ao contrário do que Planescape Torment fez com o Nameless One, por exemplo). As duas exceções, que podem ser conseguidas naturalmente pelo transcorrer da mainquest são Virgil (que encontra e guia o protagonista logo no começo do jogo) e Raven (que é filha da Silver Lady e se oferece para ajudar assim que o protagonista visita sua mãe uma segunda vez), e ambos até possuem bons motivos para acompanhar o personagem principal, mesmo que este seja só um coitado mudo que, se acreditava ser alguma espécie de escolhido mas que, no final, foi só alguém normal que foi envolvido em tudo isso ao acaso. Porém, apesar dos pesares, a rama de Arcanum se sai bem e cumpre seu papel.

Um sistema de combate bem dualizado

tela de combate de arcanum

Quanto ao combate, Arcanum é um RPG onde o jogador pode escolher entre um modo de combate em tempo real e um modo turn based (seguindo o esquema dos dois primeiros Fallout, com pontos representando as ações que o mesmo pode fazer no momento), o que dá a ele um diferencial bem interessante e bem raro de se ver em role playing games eletrônicos no geral (com Might and Magic VIVII e VIII também sendo raros casos). Tudo gira em torno de duas barras principais, a de HP (vermelha, no canto inferior esquerdo da tela) indicando a vida do personagem e a azul (no canto inferior direito), simbolizando a stamina (aqui usada tanto para magias quanto para simbolizar resistência física do personagem e se essa chegar a zero, o mesmo cai no chão inconsciente).

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O personagem principal, todavia, é o único 100% controlável e os outros (tal como também acontecia nos Fallouts) ficam a cargo de uma IA bem ruim, que só serve basicamente para personagens melee (que só vão atacar mesmo, o Dog que o diga) e heallers (que curam o HP do personagem principal que, se morrer, é game over na hora). Até existem alguns comandos que o jogador pode dar para seus companheiros, mas nem sempre eles funcionam muito bem, algo que seria facilmente remediado se a droga dos companions pudessem ser totalmente controláveis, algo que até jogos questionáveis como Baldur’s Gate permitem…

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Os companions não sobem de nível sozinhos e acompanham o protagonista (no caso se esse ter um lvl up, todos eles terão também), que por sua vez pode ter uma enorme possibilidade de customização por parte do jogador, podendo definir seu sexo (com homens tendo mais força física e mulheres maior resistência e stamina), sua raça (humano, elfo, meio-elfo, meio-orc, meio ogro, anão, hobbit/halfling, gnomo), seu nome e mesmo seu background (com ele podendo ter sido criado por orcs, filho único, ter fugido com o circo e por aí vai), com tudo isso influenciando nos stats que o mesmo terá.

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Os stats podem ser divididos em Físicos (Força/ST, Constituição/CN, Destreza/DX, Beleza/BE) e Mentais (Inteligência/IN, Força de Vontade/WP, Percepção/PE, Carisma/CH) e todos eles afetam não apenas o desempenho do personagem em combate e seus atributos principais como também as skills que ele poderá adquirir, sendo elas de Combate (que alteram a capacidade do jogador atacar e se desviar, seja com armas de dano direto ou arco e flecha), de Roubo (permitindo que o mesmo possa roubar NPCs, atacar inimigos pelas costas par amaior dano, andar stealth e encontrar armadilhas), habilidades Sociais (permitindo comprar itens por um preço melhor, apostar, se curar e convencer os outros de que estão errados) e habilidades Tecnológicas (permitindo que o jogador abra portas, desarme armadilhas, repare itens e use armas de fogo). Apesar de ainda ser um enorme número de opções, ainda são bem menores do que àquelas presentes nos dois primeiros Fallouts (que por serem baseados em GURPS, são bem saturados nesse sentido), deixando esse aspecto do jogo mais enxuto e menos aloprado, por assim dizer.

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Com isso o jogador pode escolher fazer um personagem focado em dano físico (sendo a maneira mais fácil de se finalizar o jogo, já que a maioria esmagadora dos inimigos se aproxima para atacar), alguém mais especializado em conseguir os melhores diálogos (podendo mesmo conseguir o final lamentável do Kerghan se matando) ou mesmo especializado em inteligência, com esse último ainda tendo dois caminhos totalmente distintos para se escolher: o caminho da magia e o da tecnologia. No primeiro é possível aprender vários tipos de artes arcanas de cura, dano, teletransporte e afins enquanto no outro o jogador pode criar poções, bombas, armas e até mesmo robôs que acompanham a party!

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Existem uns 80 tipos de magias disponíveis no game, tal como 56 esquemas (que são itens que o jogador precisa adquirir para conseguir criar poções, armas e gadgets), dano uma ampla variedade de opções nesse espectro do jogo. Porém vale mencionar que caso o personagem decida ir para o lado da magia, itens criados com a tecnologia não funcionarão nele, tal como magias (mesmo de cura) em alguém mais focado na tecnologia, com essa dicotomia presente no lore e na história do jogo estando bem representada dentro do gameplay o que é, com certeza, um ponto bem positivo para Arcanum nesse sentido.

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Aqui existem os fate points, conseguidos caso o jogador faça alguma quest importante, e que podem alterar algumas ações em favor do mesmo

Arcanum, tal como seus antecessores isométricos, é repleto de sidequests para serem feitas, entretanto ele possui uma vantagem gigante em comparação à maioria deles, que é o fato delas não serem a melhor fonte de XP que o jogo pode oferecer, já que inimigos comuns (sejam monstros ou caçadores de recompensa atrás do protagonista) dão boas quantidades disso, não sendo necessário muito grinding para que o mesmo chegue no nível máximo, no caso o 50.

Exploração e afins

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A exploração aqui também teve seus pontos positivos, em comparação aos seus irmãos mais velhos. Não existe mais a infame fog of war e o overworld, apesar de ainda ser uma seleção de fases, engloba todo o mundo de Arcanum, com muitas das localidades ficando disponíveis apenas se passando perto delas, e outras sendo necessário conseguir algum mapa ou encontrar alguma ponte para que a mesma apareça.

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Tal tinha em Ultima VII e em Fallout 2, o jogo possui prostíbulos onde o protagonista pode pagar pelos serviços particulares das acompanhantes…

Os gráficos não tiveram uma grande mudança dos 2 Fallouts, no geral. A ambientação steampunk de Arcanum é realmente boa, as dungeons são aceitáveis e os inimigos são bem variados, com a trilha sonora tendo músicas bem melhores que a média dos RPGs ocidentais (e também uma boa dublagem de alguns NPCs), com os portraits dos personagens tendo um aspecto de foto envelhecida bem legal. Porém, os sprites continuam a mesma porcaria de antes: pequenos, genéricos e sem nenhum diferencial perante todo o resto do jogo! 

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Os equipamentos também alteram a aparência do personagem, deixando-o ainda mais parecido com tantos outros que surgem no jogo

Se Planescape Torment conseguiu, 3 anos antes, tirar leite de pedra da trolha da Infinity Engine e fazer um cast com sprites únicos e até idle animations, porque bucetas Arcanum não pode fazer o mesmo? E não, um bloco de texto enorme dizendo que o personagem está coçando a cabeça não é a mesma coisa do que ver o maldito personagem fazendo isso, afinal é um meio eletrônico, portanto  é bom, no mínimo, utilizá-lo da melhor forma possível.

Concluindo…

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Certamente que Arcanum cumpre o seu papel primordial, de ser um jogo steampunk com uma ambientação satisfatória e de manter o legado de Fallout 1 e Fallout 2, conseguindo, inclusive, melhorar vários aspectos destes, como enxugar o sistema de skills, adicionar magias e tecnologias (sistemas dicotômicos entre si, algo que respeita o lore da narrativa), melhorar a navegação no overworld, adicionar um modo action (apesar do combate de turnos ainda ser melhor), músicas de fundo mais interessantes e até mesmo uma história com um vilão promissor, e alguns companions que possuem alguma importância dentro de tudo que está acontecendo.

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Contudo, o jogo também não está livre dos erros, como a party AINDA ser incontrolável, sprites genéricos dos personagens e, principalmente o Kerghan que, apesar de ter um excelente potencial (trazendo questionamentos sérios e importantes sobre o significado da vida e tudo o mais), é extremamente limitado por sua participação ativa ínfima na aventura (só aparecendo na reta final do jogo, mais precisamente na última sala da última dungeon) e devido à possibilidade do jogador (controlando um personagem de uns 30 e poucos anos que veio do nada) conseguir abalar suas crenças e convencê-lo a se matar, alguém que é um sábio necromante de 2000 fucking anos! 

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O jogo possui algumas cutscenes em CGI também, que não são ruins, apesar de estarem anos luz atrás das coisas feitas nos jogos da Square, por exemplo

Então, no geral, Arcanum: Of Steamworks & Magick Obscura, é aquilo que Fallout 3 seria se a série tivesse mantido o estilo 2D, trazendo boas qualidades que o fazem um RPG acima da média, mas com defeitos que o impedem de atingir o seu potencial completo. Não deixa de ser uma opção interessante para os entusiastas dos role playing games eletrônicos, algo que está longe de ser uma obra de arte, mas que cuja obscuridade não se justifica, e que certamente deveria estar presente apenas em seu nome.

Pontos Positivos:

  • Boa ambientação steampunk
  • Sistema de magias e tecnologias
  • Elementos melhorados de Fallout 1 e Fallout 2

Pontos Negativos:

  • Vilão desperdiçado
  • Party incontrolável
  • Expressividade dos sprites dos personagens inexistente
Metacritic Score
NOTA FINAL
75

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